This is Us - A série dos monólogos

Um dia desses eu assisti essa cena em algum lugar sobre como pessoas brancas reagem/reagiram aos protestos sobre racismo após a morte do George Floyd. Era a cena que eu vi essa semana depois de uma maratona de 4 temporadas com 18 episódios, cada um com mais ou menos 45 minutos. Terminei em duas semanas, aproximadamente. Foi pesado. Principalmente porque eu não sabia exatamente o que eu estava esperando encontrar quando eu finalmente dei play em This is Us. Eu sabia que havia conflito familiar, obviamente, pela cena que eu havia assistido. E que se tratava de uma série mais pé no chão e que lidava com conflitos atuais. Mas eu não esperava ficar tão imersa. Sim, esse é um dos maiores problemas quando eu começo a assistir qualquer coisa, e é por isso mesmo que eu prefiro maratonar as séries quando elas já tem um final. (Imagina se eu tivesse começado a assistir em 2018, que agonia iria ser esperar pra saber algumas viradas.)

Mas bem, eu me envolvi. A história me pegou pela mão e me levou a acreditar que eu estava vendo algo diferente, mágico. Eu não sei bem porque, pois agora, tentando analisar o que eu realmente gostei nela, a série me parece mais cheia de defeitos do que eu realmente senti enquanto acompanhava. 

Talvez seja as atuações. Ou a trilha sonora. Eu não tenho como saber, mas a série definitivamente me fez chorar e sorrir emocionada de um jeito que a muito tempo eu não fazia. A questão é... eu não consigo lembrar exatamente porque eu me senti tão emotiva.

Sim, é claro que a série tem seus pontos de pico no melodrama e são ótimos. Mas eu sei que eu não estava chorando quando o Kevin foi salvar o Randall. Ou quando o Jack finalmente morre (depois de alguns sustos dirigindo bêbado). Não... eu engoli o choro com outras coisas. Que eu não lembro o que é, porque foram tantas as cutucadas que a série me fez pra me fazer chorar que... sei lá. Se perdeu. Minha memória não gravou. O que ficou na minha lembrança foi mais o senso de urgência em ver o próximo capítulo, e a sensação de que em alguma hora ia tudo dar errado, e de que as coisas se resolviam muito fácil. Foram muitos pedidos de desculpa e muitos monólogos estranhos de tão emocionantes e claramente explicativos em que eu só ficava pensando "Nossa, numa família brasileira ninguém iria deixar o outro falar por tanto tempo." ou "Como eles sabem exatamente o que dizer com todas essas emoções passando em segundos na sua cabeça?".

Parece que o tanto que a série quer passar ser gente como a gente esbarra no tanto que o roteiro quer que os personagens sejam abertos com seus sentimentos. Gente como a gente, normais, eles estariam chorando feio ou fazendo alguns julgamentos menos nobres. Mas não, isso nunca acontece. Todos os personagens são muito bons pra serem de verdade. 

Tipo: a vez que a Deja quebra o carro do Randall e fica tudo bem. OQUE? Ou todas as vezes que o William era escorregadio e não dava pra saber o que ele tava aprontando. Aquela historinha de gato... Ah, sei lá. As pessoas, todas elas, são ~way too good~ nessa história. Até o cara que casou com a viúva do amigo nunca foi na verdade um fura olho. Ou o Toby nunca pensou em ser sacana com a chata da ~Kate da primeira temporada~. 

Sei lá. É estranho as pessoas serem só más tanto quanto serem só boas. Ou só ter pessoas boas ao seu redor. Não há ninguém que seja mais ruim do que bom, até o pai carrasco do Jack era melhor em algum momento. Eu sei que personagens bidimensionais são chatos e antiquados mas, até agora, fora o Kevin que nunca me convenceu como bom e nunca conseguirá, só vimos alguém sendo conscientemente sacana foi o ex da Kate. E acho que só porque não deram muito tempo pra ele, pois se tivesse tido desenvolvimento, certeza iam achar alguma boa ação que redimisse ou um sofrimento passado que justificasse. 

Me explica como essa discussão não acabou com eles trocando murros, faz favor.

Vamos voltar aos diamonólogos? Porque eu juro, se eu conseguisse escrever coisas tão lindas e claras assim eu nunca mais iria esperar outra pessoa falar. Minha vida seriam monólogos com finais impactantes, e saídas estratégicas e silenciosas. Um forever drop the mic. 

Se depois do diálogo acima, que finalmente vemos o Kevin sendo o filho da mãe privilegiado e babaca que sempre foi, Randall não meteu a porrada nele, ele é muito iluminado. Logo ele, que fez todo mundo aguentar aquela terapia de rehab. Fala sério, Randall tinha razão em cada palavra: "Você é viciado em atenção."



Os esteriótipos

Não existe resposta simples em this is us, isso se explica porque estamos montando um enorme quebra cabeças. Apesar da primeira temporada ser muito sensível em diversos momentos ele não deixa de ter sim esteriótipos: 

Randall é o homem negro bem sucedido que precisa acalmar e se preocupar com os vizinhos brancos, ele precisa ser perfeito por ser negro, não por ser adotado e ter complexos, mesmo que os tenha. Numa análise superficial o personagem seria descrito assim: " Ele chegou onde está porque teve em Jack um exemplo de como ser um bom pai e homem, refletindo em sua própria vida os valores dele. Contudo, Randall via Jack como um herói perfeito e tentou assimilar isso em si mesmo. Dessa forma, tornou-se perfeccionista ao extremo."
Mas aprendemos, ao longo de diversos episódios que a ansiedade do Randall não é por simplesmente querer ser como Jack. Há disposição genética por parte do William, sentimentos de inadequação causados pela própria família (vide Kevin e mãe da Rebecca), vizinhos, colegas brancos do colégio particular... e bem, o mundo racista que vivemos. Sabe, TUDO é sobre o(s) pai(s) morto(s) e apesar disso ele ainda seria ansioso.
(Eu só acho muito perturbador que mesmo depois de uma vida inteira com crises de ansiedade e dois breakdowns ninguém nunca forçou/empurrou o Randall para a terapia até chegarmos quase nos 40 anos dele. É irresponsável até da parte do sistema de saúde mental, que é bem estruturado nos EUA. Acho essa uma única falha do Randall, um personagem que aguentou muito de todo mundo e que por se achar acima da terapia, se recusou por tanto tempo a um tratamento real para o seu problema.)

As linhas da Kate só são sobre ser gorda, e isso independe se ela é boa no trabalho (no emprego de dois dias dela) ou se ela se sente culpada pela morte do pai, tudo nela ainda gira em torno de ser uma mulher obesa. Todo o arco dela lidando com peso se torna cansativo pois, sério que ela esperou estar com quase quartenta anos pra minimamente cogitar uma redução de estomago? E a resolução dessa epifania que ela teve do nada vira sobre o Toby e como ele precisa se recuperar de uma cirurgia sendo que ele, depois disso, decide se tornar saudável por conta própria e fica sarado. Do nada ela esquece que isso era O GRANDE ISSUE DELA?
Aliás, ela cresce bastante depois que ela vira alguém além do peso. Ela se torna primeiro a namorada do Toby, depois a mãe dos filhos do Toby. A personagem só realmente brilha em seus momentos de atrito e cumplicidade com a mãe. Mas aí vamos discutir maternidade depois.

E tem o Kevin. Bem, é o Kevin. Ele é bonito. Safo. Bem-sucedido em tudo que se proporciona a fazer.
Por isso eu acho difícil gostar do Kevin. Não há consequências na vida dele. Nada que ele faça, boa ou má ação, ele é o mesmo bonitinho mas sem graça. 
Não quando você usa a palavra como que passar troco né, Kevin


Mas o Big Three não existiria sem os verdadeiros astros da série não é?! Os pais. 
Mas eu preciso dizer que a personagem mais superficial é a Rebecca. E a que eu menos suporto é o Jack. 

Surpreendente? Na verdade não. É Freudiano.
 Mas vamos por partes.
 Sim, Jack e Rebecca são pais maravilhosos que fazem tudo por seus filhos e apesar de terem personalidades fortes e serem um casal apaixonado e apaixonante, não são perfeitos. Mas tudo bem, não é? Porque todas as suas pequenas imperfeições tem raízes mais profundas e nós entendemos todos os seus pequenos errinhos. 
Bem, eu não.
Eu fico puta quando penso que o Jack só é tão ovacionado como exemplo supremo de pai porque ele não viveu o suficiente pra mostrar esses defeitos. É triste que Rebecca leve todas as pancadas depois da morte dele pelo lado da Kate, a filha que ela fica tentando se aproximar insistentemente e nunca consegue. E porque? Porque o pai resolveu fazer o contrário do que devia. Eu sei que é lindo as interações da pequena Kate com o papai, mas ninguém percebe o enorme desserviço para a maternidade e para a própria Kate ele levar a menina pra tomar sorvete toda vez que ela se sente triste? Enquanto a Rebecca se força a tentar protegê-la do bullying e do sobrepeso? 


Cara, eu acho muito errado. Fazer a mãe parecer má quando é o pai que está fazendo as decisões que, mesmo não sendo por mal, são o que efetivamente afetam a auto estima da Kate criança e adulta. Por que é como eles até falam. Não funciona mais mascarar que ela não estava mais feliz com ela mesma. 
E ela nunca vai poder se dar conta que foi responsabilidade dele também, né? Porque ele morreu. Morreu e ela ainda acredita que foi culpa dela (mesmo nós sabendo por flashback que ele já tinha arritmia cardíaca mesmo antes da guerra). 
E nisso a coitada da Rebecca fica por muito tempo como saco de pancada. Ainda mais depois de descobrirem o seu grande erro como mãe: o segredo do William.


Sim. Também adoramos os William. Todos adoram o William. Ele era o personagem mais controverso em teoria, mas na prática ele era perfeito. Muito porque os episódios com enfoque nele são o mais bem contados e bem amarrados de todas as temporadas. William sim, apesar de ser viciado em drogas, ter largado o filho para trás e a mulher (que nem tinha morrido ainda), ele foi totalmente perdoado e amado. Talvez porque também tenha morrido, o que ajuda bastante.

Ele é o ultimato da quebra de expectativas.
 (Jurava que em algum momento eles iam descobrir que ele não tinha câncer e que era um grande trambiqueiro. Mas aí eu entendi a pegada da série no episódio do tio Kevin explicando para Tess e Ann e o flashback do Randall guardando o chapéu me deu nó na garganta. Eu compreendi onde a séria queria levar as minhas emoções ali.)

Mas veja, apesar de Rebecca ser uma personagem que permeia toda a série, ela no final, não deixa de ser apenas a mãe em tempo integral. Ela nunca deixou o desejo de cantar subir antes da família. Nunca pensou em substituir Jack antes de muito tempo depois, mesmo que tenha sido com o melhor amigo da família e do Jack. Ou seja. Ela nunca deixa de ser um ideal de mãe irreal e quase mágico. Inalcançável.

Mas voltando ao filhinho chato dela, eu vou até usar a citação de outra pessoa:
"Quando falo que não gosto do Kevin, algumas pessoas tentam entender o porquê e minhas explicações podem ter sido respondidas pelas palavras de Rebecca, Kevin é um personagem difícil, ele não é nada complexo. O temperamento dele é algo muito comum e muito fácil de ser interpretado (pela questão estética e não da dramatização) e talvez por isso caiu como uma luva para o ator Justin Hartley. Muitos sabem que não aprovo ele como ator, acho ele uma pessoa de uma expressão só e isso me incomoda. Assim como a complexidade que o personagem não tem, ele é apenas problemático e ponto." Opinião por SM
Aí nos últimos episódios que eu assisti só me fazem ter mais certeza de que o Kevin não pode piorar na minha visão, porque primeiro ele deixa a mãe dos filhos dele por um mês quando ela está com quase oito de gravidez de gêmeos no meio de uma pandemia. Depois quase não chega (e eu sei como é horrível a sensação de estar sozinha no parto, então pegou mais pesado ainda) e no meio do caminh, mesmo sem terem realmente resolvido seus problemas, é o Randall que está lá para amparar a Madison. Que aliás, substituiu o Toby como meu personagem adjacente favorito.

This is Us é uma grande propaganda de Constelação Familiar. Mas façam terapia galera, façam de qualquer tipo. Só façam!

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