Carta de Adeus

Para a artista e escritora francesa Sophie Calle, a única maneira de fazer arte é usar a narrativa e dentro desse terreno, seu artifício preferido, que a tornou mundialmente conhecida, é o de se valer de experiências de sua vida pessoal para a criação de seus trabalhos. No caso da mostra Cuide de Você, que será inaugurada nesta sexta, 10, para convidados e sábado para o público no galpão do Sesc Pompeia - e que a partir de 22 de setembro será apresentada no Museu de Arte Moderna da Bahia -, tudo gira em torno da carta que Sophie recebeu do escritor Grégoire Bouillier na qual ele rompia o romance dos dois.

 Levar ao pé da letra o "cuide de si" foi o que motivou esse trabalho sobre um pé na bunda mal dado.

Bem, o meu pé na bunda foi bem dado. Foi baseado no fato de que nenhum dos dois estava nem próximo de estar prontos pra sair de sua zona de conforto familiar e sermos pessas completamente diferentes em lugares diferentes e em tempos diferentes.

Essa é a minha impressão do meu último pé na bunda. Três anos atrás. Eu quis me dar mas não por inteiro. Quis por os pés nas águas frias, mas não de corpo inteiro. E fiquei só na minha ideia de como seria o reencontro perfeito. Mas o reencontro perfeito seria muito tarde, quando eu já estivesse madura e renomada o suficiente pra esfregar na cara dele que tudo o que ele me disse foi ofensivo mesmo que ele nem se desse conta, mas daí ele também estaria mais velho e experiente e nós reviveríamos a chama que outrora se apagara por besteira.
Mas na real. Isso vai demorar demais.
E eu sou impaciente. Eu queria o reencontro pra agora, quando ainda não tenho nada pra mostrar.
Então a obra de arte seria apenas um profundo stress e um eterno faz de conta.

Eu surtei. E surtei não por conta dele.
Mas porque eu não superei ele.
Eu não encontrei ninguém páreo pra ele.
Mas ele encontrou alguém que me superou. E ele está morando com ela agora.
 O que é um saco.

Meu orgulho está ferido pra caralho.
Mas é só isso. Orgulho. Vaidade.
"Ela nunca vai me superar."

Li um desabafo parecido na pesquisa da tal carta:

Carta para Sophie Calle


Escritora e fotográfa francesa, Sophie Calle, vivia feliz com seu namorado, Grégoire Bouillier, até que recebeu uma carta terminando o relacionamento, de um modo muito indireto...A partir desta carta, Sophie pediu ajuda para 107 mulheres de diversas profissões interpretarem a tal carta.
A reação dessas mulheres foi fotografada, filmada e transformada em uma exposição denominada Cuide de Você ou Prenez soin de Vous (frase que finaliza a carta).
O mais interessante é que, do início ao fim da carta há uma mistura de emoções, fazendo crer que o autor não quer terminar o relacionamente, que a ama muito, no entanto, o término é preciso e todo aquele blábláblá que só o sexo masculino sabe fazer...

Para quem ainda não leu a famosa carta:

"Há muito tempo venho tentando lhe responder seu último email. Ao mesmo tempo me parecia melhor conversar com você e dizer o que tenho a dizer em viva voz.
Mas pelo menos será escrito.
Como você pode ver, não tenho estado bem ultimamente. É como se não me reconhecesse na minha própria existência. Uma espécie de angústia terrível, contra qual não posso fazer grande coisa, senão seguir adiante e tentar superá-la, como sempre fiz. Quando nos conhecemos, você impôs uma condição: não ser a "quarta".
Eu mantive o meu compromisso; há meses deixei de ver as "outras", não achando obviamente um jeito de vê-las, sem fazer de você uma delas.
Achei que isso bastasse; achei que amar você e o seu amor seriam suficientes para que a angústia que me faz sempre querer buscar outros horizontes e me impede de ser tranquilo e , sem dúvida, de ser simplismente feliz e generoso, se aquietasse com o seu contato e na certeza de que o amor que você tem por mim foi o mais benéfico para mim, o mais benéfico que jamis tive, você sabe disso. Achei que a escrita seria um remédio, que meu desassossego se dissolveria nela para encontrar você. Mas não. Estou, esta semana, comecei a procurar as outras. E sei bem o que isso significa para mim e em que tipo de ciclo estou entrando.
Jamais menti para você e não é agora que eu vou começar.
Houve outra regra que você impôs no início de nossa história: no dia em que deixássemos de ser amantes seria inconcebível para você me ver novamente. Você sabe que essa imposição me parece desastrosa, injusta ( já que você ainda vê B..,R...) e compreensível obviamente; com isso jamais poderia me tornar seu amigo.
Mas hoje, você pode avaliar a importância de minha decisão, uma vez que estou disposto a me curvar diante da sua vontade, pois deixar de ver você e de falar com você, de aprender 0 seu olhar sobre as coisas e os seres e a douçura com a qual você me trata são coisas das quais sentirei uma saudade infinita.
Aconteça o que acontecer, saiba que nunca deixarei de amar você da maneira que sempre amei desde que nos conhecemos, e esse amor se estenderá em mim e, tenho certeza, jamais morrerá.
Mas hoje seria a pior das farsas manter uma situação que você sabe tão bem quanto eu ter ser tornado irremediável, mesmo com todo o amor que sentimos um pelo outro. E é justamente esse amor que me obriga a ser honesto com você mais uma vez, como última prova do que houve entre nós e que permanecerá único.
Gostaria que as coisas tivessem tomado um rumo diferente.
Cuide de você.
X".


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