Um dia desses...

Esses dias foi o dia da mulher. Infelizmente quase nunca atino pra essa comemoração porque eu odeio esse dia. E não só porque evidencia que não existe igualdade de gêneros em quase nenhuma civilização, mas pelo fato de que eu preciso aguentar um monte de mensagem sem sentido no meu celular o dia inteiro.

Mas resolvi fazer diferente e ouvir mulheres; e comparar com o que eu tenho recebido nessas mensagens.

Primeiro veio a história da menina do ônibus:

Ela veio na parada pedindo uns trocados pra completar a passagem e foi no caminho comigo me explicando o que tinha acontecido.
Disse que a vizinha tinha entrado em trabalho de parto tarde da noite anterior. Foram as duas subindo ladeira pra tentar encontrar táxi, do quais não queriam levá-las, mas um levou. A vizinha não levou nada, ficou lá na sala de parto pelada, sem ninguém além da amiga pra ajudar, sem médico ou enfermeira pra auxiliar. A menina, a do ônibus, uma adolescente, jovem adulta sem experiência, mas que deu apoio, estourou a bolsa sozinha, descobrindo lá que o filho não era menina como tinha dado na ultrassom. Essa menina volta na casa da vizinha, encontra o pai bem deitado em casa, nem se preocupou em ir ver a mulher, com quem já tinha 5 filhos, e ainda perguntou se era dele..., ela volta à maternidade com as roupas femininas mesmo, tentando reaproveitar algumas (já que o menino não poderia usar nenhuma rosa). Encontrou outras mulheres parindo entulhadas umas nas outras, nas mesmas salas. Uma sozinha porque o marido desmaiou. Deu banho e ajudou as meninas que estavam na mesma sala, porque as enfermeiras não iam ajudar as parturientes. E é "elogiada" com um "você tem jeito pra enfermagem";

Descaso, machismo, violência obstétrica, e um bando de macho escroto numa viagem de 30 minutos no ônibus. E essa menina ainda defendeu dizendo que alguns pais eram muito bons, quando eu disse que homem era um ser inútil (principalmente) nessas horas.

Viemos trazendo uma senhora carregando sacolas. Nos dividimos, mas vim pensando o quanto que mulheres ainda se dão o trabalho de defender pessoas que cagam na cabeça delas, e ainda mais, protegem uma masculinidade que só alimenta o sensos de superioridades.

Tenho pensado nesse texto desde aquele dia, mas deixei quieto.

Na sexta eu estive muito atarefada pra tudo. Foi dia de colação de grau do IFPE, e eu fui com Anne até o teatro central daqui de Recife/Olinda. E fico feliz em dizer que eu só vi gente incrível se formando em Artes Visuais, muitas mulheres, muito "viado", senhores e senhoras já de cabelos brancos, muitos pretos, muitos cabelinhos crespos tentando equilibrar o capelo. Fico um pouco menos feliz quando olho pra formatura de Computação Gráfica que, mesmo uma turma reduzidíssima, uma única mulher se formando. Guerreira, foi só o que eu consegui pensar quando o discurso do curso citou Olavo de Carvalho. E deus me dibre agora de computação gráfica, que só vi homens sendo... homens.


Ontem, eu fui à praia com a família do meu pai. Tive uma conversa maneira com minhas tias e a minha avó de 78 anos (toda vez eu preciso repetir pra ver se acredito). E discutimos sobre a necessidade de sermos sempre as que vão socorrê-los, como se eles fossem incapazes de sobreviver sozinhos, mas como sempre escutando gracinhas sobre tudo. Como não tivemos irmãos amigos, como os maridos sempre tiveram. Que a competição entre mulheres já começava das irmãs, e como a vida com pais "rigorosos" era difícil para uma mulher no século passado.  É inegável as heranças pobres de igualdade que tivemos quando minha avó acha horrível mulher se comparar a homem hoje em dia. E até hoje elas veem muitos absurdos pra mim, como naturais, pois era o comum.

Falando sobre algo que não era comum a nós... hoje numa conversa sobre pinga, pau do índio e coisas do norte, onde meu tio passou uma boa parte do seu tempo trabalhando nesses últimos anos, eu ouvi a história de que a "mulher do índio" ia pra feira, grávida, com menino no colo e um balaio de peixe no outro braço enquanto o índio (o "safado" estava implícito no tom de voz) ia pro outro lado da cidade beber, depois voltava, pegava a mulher quando ela tinha vendido todos os peixes, e voltava pra casa.
Ainda nessa conjuntura de reunião de família, indagaram, novamente, sobre o trabalho que a minha avó tinha, o filho "irresponsável" que fazia ela trabalhar de supetão quando avisava que ia pra lá na noite de véspera, e o fato dela se encuruchar num canto pra comer separada enquanto todos conversavam à mesa; preferia ficar à parte da "festa" e só comer depois que todos estavam servidos da comida que ela levou horas fazendo. E como isso incomodava a minha tia.
Mas isso já foi conversado... isso não vai mudar. De véspera, ou avisando semanas antes, o comportamento de vó é o mesmo. Ela o colocou / nos colocou no costume de sempre ter muita comida esperando por nós... e se colocou no lugar de quem fornece e vê os outros de longe. Não é algo que possa ser mudado sem muito trabalho de convencimento, para ela, pois fica insatisfeita ou agoniada quando a conjuntura muda. É difícil pra nós vermos que ela não vai mudar. Nós mudamos; e ela não acompanha.

É complicado pra mim ver o que chamamos hoje de direitos da mulher, foi só mais uma maneira de nos empurrar pra outro patamar de escravas. Somos mais não só parideiras. Somos as provedoras, as que cuidam, as que alimentam, as que trabalham para todo um bem estar coletivo mas nunca o nosso.
É é com desgosto que eu escuto uns vídeos de uns machos miseráveis achando que exaltar o "poder da mulher" está em fazer tudo isso e "ainda se embelezar pra nós"; Vai tomar no cu, mensagens escrotas dessas me trazem um ódio que não cabe em mim.

Alguns exemplos que deixam doente nos dias que recebo que esqueci de beber água, e agradecer por ela.




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